O governo federal enviou ao Congresso Nacional o segundo projeto de lei complementar (PLP 108/24) que regulamenta a reforma tributária aprovada no ano passado. O primeiro projeto, o PLP 68/24, foi encaminhado em abril e abordou alguns aspectos sobre o IBS, CBS e o Imposto Seletivo.
O PLP 108/24 tem como objetivo disciplinar o Comitê Gestor do IBS, o processo administrativo tributário desse tributo, além de prever mudanças no ITCMD e no ITBI, bem como especificar a destinação das receitas arrecadadas com a Contribuição para o Custeio do Serviço de Iluminação Pública (Cosip).
O Livro II do PLP 108/24 trata do ITCMD e inclui modificações introduzidas pela Emenda Constitucional nº 132 (reforma tributária). O projeto detalha definições de sucessor e doação, apresentando uma lista não exaustiva das transmissões a título gratuito que são consideradas doações para fins de incidência do ITCMD.
Ainda, o PLP dispõe que será considerado doação para fins da incidência do ITCMD, “os atos societários que resultem em benefícios desproporcionais para sócio ou acionista praticados por liberalidade e sem justificativa negocial passível de comprovação, incluindo distribuição desproporcional de dividendos, cisão desproporcional e aumento ou redução de capital a preços diferenciados“.
Na prática, este dispositivo visa mitigar a realização de planejamentos tributários ao equiparar a distribuição desproporcional de lucros, cisão desproporcional e redução de capital à doação.
Essa tentativa de tributar a distribuição desproporcional de lucros como doação não é inédita. Alguns estados, como Santa Catarina, já preveem isso em sua legislação, argumentando que a distribuição desproporcional de lucros implica na transmissão não onerosa de direitos, pois a participação nos lucros é um direito dos sócios e quem decide sobre a distribuição são os próprios sócios, não a empresa. Eles também argumentam que a operação deve ter um propósito negocial justificável.
O governo justifica a inclusão deste dispositivo para introduzir normas anti-abuso específicas, proporcionando objetividade e previsibilidade tanto para o contribuinte quanto para o ente tributante.
Embora essa medida vise evitar fraudes, é necessário que os Estados, através de um procedimento administrativo comprovem a ausência de justificativa negocial, e não haja presunção prévia e legitimada de irregularidade nas transações realizadas pelos contribuintes.
É importante lembrar que o ato de lançamento é um ato administrativo que deve ser motivado e acompanhado das provas obtidas ao longo do procedimento de fiscalização, formalizando o fato jurídico tributário. A ausência de propósito negocial não pode ser presumida por lei.
Se tal redação prevalecer, irá potencializar debates administrativos e judiciais sobre a legalidade dos planejamentos tributários. A título de argumento, existem precedentes favoráveis aos contribuintes quanto a legalidade da distribuição desproporcional de lucros, desde que esteja devidamente estipulada em contrato social e em conformidade com o código civil.
O texto do PLP foi entregue à Câmara dos Deputados será analisado pelas comissões responsáveis e submetido à votação em Plenário, em dois turnos. Após aprovação, o projeto seguirá para o Senado, que realizará votação em turno único e, por fim, seguirá para sanção ou veto presidencial.
O Núcleo de Planejamento Tributário do Marins Bertoldi Advogados acompanha atentamente os desdobramentos do tema e coloca-se à inteira disposição para sanar eventuais dúvidas e aprofundá-lo dentro de cada realidade empresarial.
Por: Mariana de Meira Todeschini e Ana Caroline Ferreira