O planejamento sucessório por meio de holdings tem ganhado destaque entre famílias empresárias, pois possibilitam a integração dos aspectos familiares, jurídicos, tributários e de gestão do patrimônio familiar e empresarial. Saiba mais sobre os benefícios das holdings familiares clicando aqui.
Nesse contexto, surgiu na internet uma tese “milagrosa” que promete reduzir drasticamente os impostos incidentes sobre a sucessão do patrimônio: o chamado “Modelo de Três Células”. À primeira vista, esse planejamento parece oferecer benefícios tributários e sucessórios significativos para o patrimônio familiar, mas ele envolve riscos que podem ser fatais para o patrimônio e negócio da família empresária.
O SISTEMA DE TRÊS CÉLULAS
Neste modelo, é aberta uma holding denominada “Célula Destino”, com capital social integralizado em dinheiro, representando uma parcela do patrimônio familiar. As quotas dessa holding são doadas aos sucessores, mantendo-se a cláusula de usufruto para os doadores.
Em seguida, é criada uma segunda holding, denominada “Célula Cofre”, para a integralização dos bens familiares. Posteriormente, constitui-se a “Célula Veículo”, cujo capital social é formado pelas quotas da “Célula Cofre”, integralizadas utilizando técnicas de ágio e reserva de capital, para reduzir o valor do capital social e a tributação sobre o patrimônio.
Finalmente, a “Célula Destino” adquire onerosamente as quotas da “Célula Veículo”, tornando-se sua proprietária e, indiretamente, da “Célula Cofre”. O objetivo desse sistema é pagar o ITCMD apenas sobre a transferência das quotas da holding aos sucessores, evitando a carga tributária sobre todo o patrimônio.
Entretanto, o uso desse sistema é complexo e traz riscos consideráveis, que vão desde o planejamento tributário abusivo até a possível configuração de crime contra a ordem tributária.
RISCOS DE PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO ABUSIVO E OCULTAÇÃO DE BENS
Um ponto crucial a ser considerado neste modelo é o Imposto de Renda (IR). Anualmente, é necessário declarar o Imposto de Renda, mapeando todo o patrimônio da pessoa e calculando o quanto ela deve pagar sobre o acréscimo patrimonial.
Quando alguém adota esse modelo de planejamento, a mudança abrupta no IR é um sinal de alerta. Na Declaração do Imposto de Renda da Pessoa Física (DIRPF), é apresentada a mudança patrimonial de um ano para outro para fins de tributação. Neste cenário, o patrimônio de uma pessoa pode “evaporar” de um ano para outro, transformando-se apenas em quotas de uma única sociedade.
Por exemplo, imagine uma pessoa com 20 milhões de reais em patrimônio, todos declarados no ano-calendário anterior, que decide implementar esse modelo. Os 20 milhões então se tornam 200 mil quotas da “Célula Destino”, que são transmitidas aos filhos. De um ano para o outro, praticamente 19,8 milhões de reais desaparecem da DIRPF sem uma determinada contraprestação. Isso levanta suspeitas na Receita Federal, podendo resultar em fiscalização da operação e multas por simulação e planejamento tributário abusivo.
Outro ponto a se destacar é que, além do planejamento tributário abusivo, esse planejamento pode se caracterizar como ocultação de bens, crime previsto na Lei n.º 9.613/98. Assim, além da multa de natureza tributária, a família pode se deparar com uma representação fiscal para fins penais.
Apesar de existirem defensores deste modelo de planejamento sucessório, os riscos atrelados a ele são muito altos. Um exemplo disso é a recente “Operação Loki”, realizada pela Sefaz/SP para apurar a simulação em operações de natureza societária.
Por fim, destaca-se que o custo de manutenção desse modelo pode ser elevado, dependendo de como ele é implementado, tornando-se desvantajoso a médio e longo prazo.
CONCLUSÕES
Enquanto o “Modelo de Três Células” pode parecer atraente para a redução de impostos, ele apresenta riscos significativos que devem ser cuidadosamente ponderados. Compreender todos os riscos envolvidos é essencial para avaliar o custo-benefício dessa estratégia, bem como entender as possíveis implicações que ela pode ter para o patrimônio familiar e os negócios da família.
Por essas razões, é essencial contar com uma consultoria jurídica especializada, capaz de entender as nuances do planejamento sucessório e viabilizar a melhor solução para cada caso.
Por: Fabio Ramos Lacerda de Oliveira
Advogado do Núcleo Governança do Marins Bertoldi