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Como transformar seus Recebíveis em Capital, com Segurança Jurídica, Eficiência e Otimização Tributária

Publicado em: 23 jun 2025

Por Carolina Schramm

Empresas que operam com um volume recorrente de vendas a prazo, financiamentos e/ou prestação de serviços parcelados enfrentam o desafio constante de equilibrar fluxo de caixa, reduzir dependência de crédito bancário e melhorar indicadores financeiros.  

Nesse contexto, o Fundo de Investimento em Direitos Creditórios (“FIDC”) surge como uma solução estratégica para transformar recebíveis em capital de forma estruturada, com benefícios fiscais e societários relevantes. 

Com a crescente sofisticação do mercado de capitais brasileiro e o aumento do apetite por instrumentos alternativos de financiamento e investimento, o FIDC tornou-se uma alternativa viável e estratégica, tanto para empresas que buscam liquidez e benefícios fiscais, quanto para investidores que desejam diversificação e previsibilidade de fluxo de caixa. 

Mais do que um instrumento financeiro, o FIDC é uma ferramenta de gestão e captação que pode melhorar a saúde financeira da empresa, atrair investidores e liberar recursos para expansão. 

Vale destacar, no entanto, que o FIDC é indicado para empresas com carteira de recebíveis relevante, recorrente e com baixo índice de inadimplência, sendo especialmente vantajoso para varejistas e e-commerces com recebíveis de cartão, escolas e universidades com mensalidades parceladas, prestadores de serviços com contratos recorrentes, indústrias com carteira de clientes B2B, construtoras e incorporadoras com recebíveis imobiliários, fintechs, factorings e empresas de crédito privado, por exemplo. 

O FIDC, juridicamente constituído sob a forma de um condomínio fechado ou aberto, é regulado atualmente pela Resolução da CVM nº 175/2022 (que substituiu a Instrução da CVM nº 356/2001), e destinado à aquisição de direitos creditórios. Tais créditos podem derivar de duplicatas, contratos de financiamento, aluguéis, créditos educacionais, planos de saúde, dentre outros. 

A sua estruturação envolve diversos agentes, tais como: i) o cedente (empresa que origina os direitos creditórios e transfere os recebíveis para o fundo, recebendo antecipadamente o valor presente desses créditos com deságio); ii) o cessionário (próprio FIDC, que compra os direitos creditórios, passando a ser o titular dos créditos a eles relativos em face dos devedores, distribuindo os resultados aos seus quotistas); iii) os quotistas (que aplicam seus recursos no FIDC, para fins de financiamento da aquisição dos recebíveis), sendo as quotas classificadas em tipo sênior (prioridade no recebimento e menor risco), mezanino (se existente, com risco e retornos intermediários) e subordinada (que assume os primeiros riscos de eventual inadimplência, servindo de proteção às quotas sênior); iv) o administrador (instituição financeira autorizada pela CVM responsável pela gestão operacional, contratação de prestadores de serviços e pela prestação de informações aos quotistas e à CVM); v) o gestor (pessoa contratada pelo administrador para seleção dos direitos creditórios que comporão a carteira do fundo, dentro de critérios estabelecidos em seu regulamento); vi) o custodiante (instituição financeira, o administrador ou um terceiro especializado, que faz o controle dos direitos creditórios adquiridos); vii) o auditor independente (empresa especializada que realiza auditoria periódica nas demonstrações financeiras do FIDC, assegurando transparência e veracidade das informações prestadas aos investidores; e viii) o consultor de crédito, caso existente (empresa ou profissional especializado em análise de crédito, de modo a prever riscos de inadimplemento).  

O processo de constituição do FIDC engloba, sem se limitar: i) a análise de sua viabilidade e das vantagens do ponto de vista tributário, contábil e societário; ii) a definição de suas características (se aberto ou fechado, se voltado a investidores qualificados, profissionais ou gerais, seus tipos de créditos, critérios de elegibilidade concentração, risco e política de distribuição de rendimentos, por exemplo); iii) a elaboração de seu regulamento, da escritura de emissão e quotas, dos contratos com prestadores de serviços e de cessão de créditos, da política de crédito e elegibilidade e outros instrumentos jurídicos; iv) a contratação dos prestadores de serviço obrigatórios (administrador, gestor, custodiante, auditor, etc.); v) a criação de um CNPJ, o registro do fundo na CVM e na B3, neste último caso, se houver a negociação de quotas em mercado secundário (quando investidores negociam entre si ativos que já foram emitidos). 

O funcionamento do FIDC, por sua vez, é regido pelo seu regulamento, que define, dentre outros assuntos, políticas de investimento, critérios de elegibilidade dos créditos, perfil dos quotistas, regras de remuneração, amortização e resgate, direitos e deveres dos participantes, regras sobre emissão e negociação das quotas, governança e administração, taxas, encargos e despesas, regras de assembleias, liquidação e encerramento, direito à informação, dentre outras. 

A criação de um FIDC exige, assim, uma estrutura robusta que envolve alguns custos fixos. No entanto, apesar dessas despesas, a economia com juros bancários, o ganho de previsibilidade e a eficiência tributária costumam compensar amplamente o investimento para empresas com o perfil adequado. 

Dentre as vantagens tributárias que um FIDC pode oferecer, citam-se, a título de exemplo: i) o FIDC, por ser constituído na modalidade de condomínio, é isento de impostos diretos sobre a sua própria atividade, como IRPJ, CSLL, PIS e COFINS; e ii) para os quotistas, a tributação segue a tabela regressiva do imposto de renda sobre a renda fixa, com alíquotas que vão de 22,5% a 15%, dependendo do prazo de aplicação, sendo utilizado: ii.i) para os FIDCs abertos, o sistema de “come-cotas”, com antecipação semestral do imposto de renda e, ii.ii) para os FIDCs fechados, a incidência do imposto de renda apenas no resgate, amortização ou venda das quotas, sem come-cotas, permitindo o diferimento da tributação. De outro lado, a empresa cedente pode se beneficiar de uma despesa financeira dedutível para fins de cálculo do IRPJ (15% + adicional de 10%) e CSLL (9%), quando da cessão de seus créditos com deságio, no importe total de 34%, caso seja tributada pelo lucro real. 

Além do aspecto tributário, o FIDC também oferece vantagens societárias relevantes, a saber: i) redução dos custos de captação e sem que haja diluição societária: recursos captados diretamente de investidores, o que reduz a dependência do crédito bancário tradicional e a necessidade de negociação de taxas mais atrativas; ii) governança e transparência: a constituição de um FIDC exige a participação de agentes fiduciários, custodiante e auditoria independente, o que melhora o nível de governança e credibilidade da empresa perante o mercado; iii) facilidade de estruturação personalizada: o FIDC pode ser estruturado sob medida, com diferentes classes de quotas (sênior, mezanino, subordinada), permitindo calibrar o risco entre os investidores; iv) maior proteção dos recebíveis: eventual execução (civil ou fiscal, por exemplo), recuperação judicial ou até falência, em face da empresa cedente, não poderão expropriar os recebíveis transferidos ao FIDC, protegendo-os dos riscos da atividade operacional da empresa que os originou; v) planejamento patrimonial e sucessório: o FIDC pode ser utilizado como veículo para reorganização de ativos e sucessão empresarial; vi) melhoria de indicadores contábeis: se a cessão de créditos para o FIDC for feita de forma estruturada, com transferência efetiva dos riscos e benefícios dos recebíveis, isso permite à empresa retirar os ativos do balanço, gerando uma melhoria contábil nos indicadores de liquidez, endividamento e solvência. 

De todo o exposto, portanto, verifica-se que empresários que operam com carteira relevante de recebíveis devem considerar seriamente a estruturação de um FIDC, especialmente em momentos de juros altos, retração de crédito e necessidade de capital para expansão. 

Para sua correta implementação, contudo, é essencial que haja uma assessoria jurídica especializada, dada a complexidade documental e regulatória envolvida (CVM, ANBIMA, BACEN), bem como, a necessidade de uma análise tributária e contábil individualizada para cada estrutura. 

Em havendo interesse, não hesite em agendar uma consulta com os especialistas do escritório Marins Bertoldi Advogados, que lhe auxiliarão no que for preciso.  

Carolina Schramm

Iniciou sua carreira jurídica como advogada há mais de vinte anos na cidade de Joinville, Estado de Santa Catarina, sua terra natal, tendo trabalhado em escritórios de advocacia de médio...
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