O princípio da boa-fé é salutar em qualquer relação de emprego, pois a partir dele desdobram-se deveres de honestidade e lealdade recíprocos pelas partes envolvidas, contexto em que se insere a responsabilidade conferida ao empregado pela preservação da confidencialidade de informações sigilosas recebidas durante a prestação de serviços ao empregador.
O empregador, para assegurar-se quanto à preservação de segredo da empresa, pode celebrar uma cláusula de não-concorrência com o empregado, seja na admissão ou no curso contratual.
Caso o empregado venha a violar segredo da empresa na vigência do vínculo de emprego configura-se falta grave e constitui motivo para autorizar a rescisão contratual por justa causa pelo empregador, havendo previsão legal expressa neste sentido, especificamente no artigo 482, alínea “g” da Consolidação das Leis do Trabalho.
Por outro lado, encerrada a relação contratual, quando em tese não há mais direitos e deveres pelas partes, seria válida a exigência pelo empregador de que seu ex-empregado preserve a confidencialidade das informações adquiridas na constância do emprego através da pactuação de cláusula de não-concorrência?
Ora, apesar da Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso XIII, assegurar ao trabalhador o livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, o que por si só constitui argumento contundente para a não validação da cláusula de não-concorrência após a rescisão do contrato de emprego, uma análise mais aprofundada do questionamento, à luz da boa-fé e considerando que nenhum direito é absoluto, permite admiti-la com todos os seus efeitos.
Isso porque não se pode perder de vista que o empregador tem o direito de zelar pela sua propriedade e inventos, e a partir do momento que o ex-empregado dissipa ou faz mau uso dos dados sigilosos obtidos da empresa, acaba por violar o dever de lealdade esperado, o que pode implicar em severas consequências ao empregador e até mesmo colocar “em xeque” a continuidade da atividade empresarial de forma saudável.
Sob este viés, a cláusula de não-concorrência projeta para além do período contratual os efeitos do princípio da boa-fé, ocupando-se da preservação de uma informação excepcional e sigilosa da empresa, o que, isoladamente, não fere a liberdade do exercício da profissão do ex-empregado, pois apenas lhe impõe uma restrição de uso de informação sigilosa adquirida do antigo empregador, sob pena de responsabilização civil em caso de sua não observância.
Some-se a isso a liberdade de estipulação das relações de trabalho pelas partes interessadas, desde que seguradas as disposições de proteção ao trabalho, normas coletivas e decisões das autoridades competentes, prevista no artigo 444 da CLT.
Ainda no que toca à validade da cláusula de não-concorrência, a fim de afastar eventual contorno de abusividade, razoável que seja estabelecida com delimitação de prazo de duração, espaço territorial de abrangência, detalhamento específico e objetivo da restrição de manejo da informação, bem como trazer consigo uma compensação indenizatória ao ex-colaborador pelo dever de sigilo enquanto perdurar a cláusula.
Observados tais aspectos, chancela-se a validade da cláusula de não-concorrência após extinto o contrato de emprego, sobretudo porque preservada a garantia de liberdade profissional do ex-empregado. Ainda por representar ferramenta útil a resguardar o empregador dos efeitos devastadores que uma quebra de sigilo de informação confidencial poderia lhe render pelo seu uso indiscriminado, pois, nesta última hipótese, teria subsídio contratual contundente para neutralizar os prejuízos por meio de ação de reparação de danos na esfera cível.
Bruno Capetti, advogado especialista em Direito Trabalhista do Marins Beroldi Advogados Associados.