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Lei 14.973/2024: Impactos das novas regras para a correção monetária dos depósitos judiciais e extrajudiciais

Publicado em: 02 out 2024

A Lei 14.973/20241, sancionada recentemente, disciplina sobre a desoneração da folha de pagamento, introduzindo contrapartidas para auxiliar o governo no cumprimento da meta fiscal de 2024. Dentre elas, há a redefinição das regras atinentes à correção dos depósitos judiciais e administrativos em processos envolvendo a União, qualquer de seus órgãos, fundos, autarquias, fundações ou empresas estatais federais dependentes.

Com base na nova legislação, os depósitos poderão sofrer a incidência exclusivamente de “índice que reflita a inflação”, como é o caso do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). A mudança representa uma significativa alteração em relação à legislação anterior, que estabelecia tão somente a Taxa SELIC como índice de correção aplicável, vigente há 26 anos.

Tal situação é relevante, especialmente, no âmbito tributário, posto que o depósito é causa de suspensão da exigibilidade do crédito tributário. Desse modo, todos os riscos decorrentes da exigibilidade do débito são suspensos, tais como inscrição em cadastros restritivos de crédito, impossibilidade de emissão de certidão de regularidade fiscal e protestos.

Ao final da discussão, caso o contribuinte tenha êxito em seu questionamento, este poderá realizar o levantamento do valor depositado, que até então era devolvido com base na correção pela SELIC.

Agora, a nova legislação (14.973/2024) prevê a correção monetária por índice oficial que reflita a inflação, conforme disposto no seu art. 37, inciso II 2, em disposição genérica e sujeita à interpretação.

E mais, apesar de o Governo Federal adotar o IPCA como índice oficial de inflação, o seu uso não é expressamente consignado pela referida legislação, deixando salvo-conduto para o Poder Executivo regulamentar a questão, inclusive em relação aos depósitos já realizados, fato que aumenta ainda mais a insegurança jurídica no país.

Nesse sentido, é fundamental esclarecer que a SELIC, enquanto índice híbrido, compõe a correção monetária e juros. Quando a nova legislação prevê a adoção de índice que reflita somente a inflação, o contribuinte não será mais remunerado pelo tempo em que renunciou à disponibilidade do montante depositado, o que resultará redução significativa do valor a ser levantado pelo contribuinte em caso de êxito em sua defesa.

Ainda, há incerteza em relação à aplicação da lei e respectiva regulamentação a ser procedida pelo Poder Executivo, na situação em que o contribuinte opte pelo depósito judicial do crédito tributário e venha, ao final, perder a discussão.

Nesse caso, a depender da forma que será aplicada a legislação em questão, poderá o contribuinte ter que desembolsar valores, além daqueles depositados, uma vez que o crédito tributário é corrigido pela SELIC, ao passo que o depósito tende a ser corrigido pelo IPCA.

Em linhas gerais, referida alteração configura tratamento desigual adotado pela União, uma vez que, conforme mencionado anteriormente, os créditos tributários são corrigidos pela SELIC, ao passo que, de acordo alteração perpetrada, o contribuinte que realizar o depósito não terá mais direito a receber os juros de mora. A título de comparação, atualmente a SELIC está em 10,75%3, enquanto o IPCA acumula 4,24%4 em 12 meses.

Na prática, portanto, vislumbra-se o desestímulo à realização dos depósitos judiciais, visto que, caso um contribuinte opte por adimplir um tributo que repute indevido, ao final da ação, poderá pedir a repetição do indébito ou compensação, cuja correção se dará pela SELIC, ao passo que o contribuinte que optar pelo depósito, terá seu montante corrigido pelo IPCA, importando menor proveito econômico.

Desse modo, diante das incertezas que perpassam o tema, certamente haverá o questionamento judicial por parte dos contribuintes, especialmente considerando a disparidade entre a correção aplicável aos débitos tributário (SELIC) e os depósitos realizados para garanti-los (IPCA).

O Núcleo de Direito Tributário do Marins Bertoldi Advogados acompanha atentamente os desdobramentos do tema e coloca-se à inteira disposição para sanar eventuais dúvidas e aprofundá-lo dentro de cada realidade empresarial, especialmente considerando a relevância da controvérsia na definição das estratégias na condução dos processos.

Por Matheus André Ribeiro e Rafael Pilch de Matos


1 Disponível online em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2023-2026/2024/Lei/L14973.htm. Acesso em 30 de setembro/24.

2 Art. 37. Conforme dispuser a ordem da autoridade judicial ou, no caso de depósito extrajudicial, da autoridade administrativa competente, haverá: (…) II – levantamento dos valores por seu titular, acrescidos de correção monetária por índice oficial que reflita a inflação.

3 Disponível online em: https://www.bcb.gov.br/controleinflacao/taxaselic. Acesso em 30 de setembro/24.

4 Disponível online em: https://www.ibge.gov.br/explica/inflacao.php. Acesso em 30 de setembro/24.

Matheus André Ribeiro

Matheus iniciou sua carreira em um grupo multinacional norte-americano, em 2016, sendo responsável pelo auxílio executivo e administrativo interno da empresa, providenciando diligências e solucionando conflitos. Em 2019, durante a...

Rafael Pilch de Matos

Rafael obteve sua primeira experiência profissional ainda na graduação, por meio de estágio realizado em escritório localizado na cidade de Curitiba, onde permaneceu, após a sua graduação no curso de...
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