São mais comuns do que se imagina os casos em que um dos cônjuges mantém, com outra pessoa e paralelamente ao casamento, relacionamento análogo à união estável. Frise-se o termo “análogo”, pois a convivência, apesar de poder preencher os requisitos caracterizadores da união estável – ser pública, contínua, duradoura e com o objetivo de constituição de família –, não pode ser formalmente considerada como tal, pois envolve pessoa já casada e, portanto, impedida de se casar novamente, nos termos do artigo 1.521, VI, do Código Civil[1]. Tal relação se encaixa, portanto, no conceito de concubinato, previsto no artigo 1.727 do Código Civil[2].
Se judicialmente reconhecida como união estável, todavia, tal relação seria paralela ao casamento e demandaria, no lugar da meação, uma triação – ou seja, a divisão em três partes – dos bens adquiridos na concomitância dos dois vínculos na ocorrência de falecimento de uma das partes, divórcio ou dissolução da união estável paralela.
Apesar de legalmente vedada, já houve decisões que reconheceram a existência de uniões estáveis paralelas e que determinaram a triação. O TJRS, por exemplo, ao julgar a apelação cível nº 70082663261 em 2020, considerou o impedimento do artigo 1.521, VI, do Código Civil, uma “demasiada intervenção estatal” e um “formalismo legal que não pode prevalecer sobre situação fática há anos consolidada”. Além disso, estabeleceu que “deixando de lado julgamentos morais, certo é que casos como o presente são mais comuns do que pensamos e merecem ser objeto de proteção jurídica, até mesmo porque o preconceito não impede sua ocorrência, muito menos a imposição do ‘castigo’ da marginalização vai fazê-lo. Princípio da monogamia e dever de lealdade estabelecidos que devem ser revistos diante da evolução histórica do conceito de família, acompanhando os avanços sociais.”
Posteriormente, entretanto, o assunto foi julgado em 2020 e 2021 pelo STF, que afastou a possibilidade da existência de uniões estáveis paralelas, em concordância com os princípios da monogamia e fidelidade que permeiam o ordenamento jurídico brasileiro. Como resultado, foram firmados os temas 526[3] e 529[4].
Esse entendimento foi reforçado recentemente pelo STJ que, em julgado de 2022 (em segredo de justiça, conforme a notícia veiculada em seu site oficial[5]), estabeleceu que é “incabível o reconhecimento de união estável simultânea ao casamento, assim como a partilha de bens em três partes iguais (triação)”. A relatora do caso, Ministra Nancy Andrighi, reconheceu como concubinato o vínculo concomitante ao casamento.
Nesse sentido, o entendimento atual, de acordo com as cortes superiores, é no sentido de que não é possível o reconhecimento de uniões estáveis paralelas e triação, com fundamento central nos princípios da monogamia e fidelidade. A relação concomitante ao casamento é considerada, portanto, concubinato.