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REFORMA TRIBUTÁRIA: Impactos para as plataformas digitais no Brasil e a comparação com o IVA Europeu

Publicado em: 29 maio 2024

A expansão do comércio digital nos últimos anos trouxe novos debates e desafios sobre a tributação destas operações, principalmente no que diz respeito à responsabilização tributária das plataformas digitais.

Em um cenário Pré-Reforma Tributária, alguns Estados – como Rio de Janeiro, Bahia, Ceará e Mato Grosso – instituíram normas estaduais buscando ter acesso às informações das transações, com o intuito de atribuir às plataformas digitais a responsabilidade tributária pelo recolhimento do ICMS não adimplido pelo efetivo vendedor, diante da participação destes players nas operações.

Porém, diante da conjuntura do ordenamento jurídico brasileiro anterior à Emenda Constitucional nº 132/2023, havia certa cautela em responsabilizar os intermediadores pelo não recolhimento do tributo estadual. O motivo principal é que, nos termos do art. 155, da CF/88, o ICMS incide sobre as operações de circulação de mercadorias, ou seja, operações de mercancia[1].

Considerando que a atividade dos marketplaces consiste na intermediação de uma operação de compra e venda entre o seller (vendedor da mercadoria) e o consumidor final, estas plataformas não adquirem a propriedade do bem para transferi-la a terceiro, razão pela qual não realizam operação mercantil.

Este cenário terá novos capítulos com a reforma tributária, em especial, com a EC nº 132/2023 e eventual promulgação do PLP nº 68/2024.

Inicialmente, o § 1º do artigo 23 do PLP definiu plataformas digitais como aquelas que atuam como intermediárias entre fornecedores e adquirentes em operações realizadas de forma não presencial ou por meio eletrônico, e que controlam um ou mais elementos da negociação da operação como (i) a cobrança, (ii) o pagamento e (iii) a definição dos termos e condições ou (iv) entrega.

O Projeto de Lei também definiu, no § 2º do artigo 23, o que não são plataformas digitais. Trata-se dos casos em que existe apenas fornecimento de acesso à internet, processamento de pagamentos, publicidade, ou, ainda, busca ou comparação de fornecedores, desde que não haja cobrança pelo serviço com base nas vendas realizadas.

Tendo isso em mente, as novas alterações passaram a prever que a responsabilidade tributária do IBS e da CBS poderá ser atribuída a qualquer pessoa que incorra na realização, execução ou pagamento da operação.

Tratando exclusivamente do IBS, o Governo Federal buscou evitar novas discussões entre “mercadorias” e “serviços” para fins da incidência do ICMS x ISS, instituindo um imposto único sobre o consumo, tal como ocorre no sistema europeu por meio do IVA.

No modelo europeu, a partir da Diretiva UE 2017/2455[2], passou-se a estabelecer a responsabilidade tributária das plataformas digitais que realizassem a intermediação entre vendedores localizados fora da União Europeia e consumidores residentes do bloco econômico.

O objetivo da medida foi garantir o recolhimento do tributo nestas transações, de modo que esta responsabilidade só seria afastada caso se comprovasse cumulativamente: (i) a ausência de participação nos termos e condições da operação da venda; (ii) a ausência de envolvimento no processo de pagamento; e (iii) a ausência de envolvimento no processo de entrega.

Voltando o foco para o Brasil, o artigo 23, do PLP nº 68/2024, traz duas hipóteses para responsabilização tributária das plataformas digitais operantes no Brasil:

  • A primeira delas impõe às plataformas a responsabilidade por substituição, no caso do fornecedor ser residente ou domiciliado no exterior;
  • Já na segunda hipótese, a plataforma será responsável solidária com o fornecedor residente ou domiciliado no país, caso não tenha se inscrito no cadastro de contribuintes do IBS/CBS, ou que não tenha registrado a operação em documento fiscal eletrônico.

Em relação ao primeiro ponto, o Poder Legislativo buscou, em certa medida, aderir ao modelo europeu de responsabilização instituído a partir da Diretiva UE 2017/2455.

Já em relação ao segundo ponto, não há dúvidas que é muito mais efetivo (e até mais vantajoso) fiscalizar e exigir o tributo das grandes plataformas digitais do que dos efetivos vendedores de mercadorias. Contudo, é necessário um olhar atento às condições fáticas da operação para que não seja atribuída a responsabilidade tributária aos players que não detenham acesso às informações necessárias para o adimplemento da obrigação tributária.

Em suma, muito embora a regulamentação da reforma tributária tenha dado um primeiro passo, o cenário envolvendo as plataformas digitais pelo IBS/CBS ainda poderá ainda ser alvo de novos desdobramentos. Principalmente, porque há certa dúvida em saber se estes players manifestam capacidade contributiva para justificar sua responsabilização tributária.

O PLP nº 68/2024 foi entregue recentemente ao Congresso Nacional, o que certamente ocasionará novas discussões em prol de uma regulamentação simples e efetiva das operações intermediadas pelas plataformas digitais.

O Núcleo de Direito Tributário do Marins Bertoldi Advogados acompanha atentamente os desdobramentos do tema e coloca-se à inteira disposição para sanar eventuais dúvidas e aprofundá-lo dentro de cada realidade empresarial.

[1] STF, ADC 49: “A hipótese de incidência do tributo é a operação jurídica praticada por comerciante que acarrete circulação de mercadoria e transmissão de sua titularidade ao consumidor final.” (STF, ADC 49, Tribunal Pleno, DJe 03/05/2021).

[2] Disponível em: https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=CELEX%3A32017L2455

Por Augusto Chimborski e Luiza França Pecis

Augusto Chimborski

Augusto Chimborski iniciou sua trajetória profissional como estagiário no escritório Marins Bertoldi Advogados, atuando nas áreas contenciosa e consultiva para clientes de diversos setores da economia. Após se graduar em...
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