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STJ fixa entendimento sobre o arbitramento da base de cálculo do ITCMD 

Publicado em: 12 dez 2025

Por Ana Caroline Ferreira e Yasmin Taborda Agostinhaki 

Em julgamento realizado em 10 de dezembro, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) consolidou entendimento relevante acerca da possibilidade de arbitramento da base de cálculo do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) pela Administração Fazendária, com fundamento direto no art. 148 do Código Tributário Nacional (CTN). A matéria foi analisada pela Primeira Seção, sob o rito dos recursos repetitivos, no julgamento do Recurso Especial nº 2.175.094/SP, que deu origem ao Tema 1.371. 

A controvérsia teve origem em ações ajuizadas por contribuintes contra atos da Fazenda do Estado de São Paulo, nos quais se questionava a legitimidade do arbitramento da base de cálculo do ITCMD quando o Fisco entendia que o valor declarado não correspondia ao valor de mercado dos bens transmitidos. 

Ao apreciar os casos, o Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu a segurança, sob o fundamento de que a Lei estadual nº 10.705/2000 já definiria a base de cálculo do imposto como o valor venal do bem, não sendo legítima, portanto, a adoção de critérios distintos pela Administração Fazendária na ausência de previsão legal específica. 

Contra esse entendimento, a Fazenda paulista interpôs recurso ao STJ, sustentando que o procedimento de arbitramento previsto no art. 148 do CTN constitui norma geral de direito tributário, aplicável sempre que as informações prestadas pelo contribuinte se mostrem insuficientes, inconsistentes ou destituídas de credibilidade. 

Ao apreciar o tema, o STJ enfrentou a relação entre as normas gerais do CTN e a legislação estadual do ITCMD, especialmente no que se refere aos limites da atuação administrativa na apuração da base de cálculo do tributo. 

A relatora do caso, ministra Maria Thereza de Assis Moura, manifestou-se pelo não conhecimento do recurso, ao entender que a controvérsia dizia respeito à interpretação da legislação estadual, o que afastaria a competência do STJ para examinar a matéria em sede de recurso especial. 

Em seu voto, a ministra destacou que o CTN estabelece diretrizes gerais, ao indicar que a base de cálculo do ITCMD corresponde ao valor venal do bem e ao prever o arbitramento como técnica possível de apuração. Caberia, contudo, à legislação estadual detalhar os critérios de avaliação, bem como disciplinar as hipóteses concretas em que o arbitramento poderia ser utilizado. 

Para a relatora, discussões envolvendo o uso de valores de referência ou a substituição do valor declarado por outro estimado pela Administração não dizem respeito à definição da base de cálculo em si, mas ao método de apuração do tributo, matéria inserida na esfera normativa dos Estados. 

Em voto divergente, posteriormente acolhido pela maioria da Primeira Seção, o ministro Marco Aurélio Bellizze entendeu que a prerrogativa de arbitramento do ITCMD decorre diretamente do art. 148 do CTN, o qual se impõe como norma geral de observância obrigatória. 

Segundo o voto vencedor, embora os Estados possam definir os critérios ordinários de apuração da base de cálculo do ITCMD, isso não afasta a possibilidade de a Administração instaurar procedimento de arbitramento quando o critério inicialmente adotado se revelar inadequado para refletir o valor real do bem transmitido. 

O ministro destacou que o Tribunal de Justiça de São Paulo havia afastado o arbitramento de forma ampla e genérica, o que não se compatibiliza com o modelo previsto no CTN. Ressaltou, contudo, que o arbitramento não pode ser automático, nem servir como instrumento discricionário irrestrito para desconsideração das declarações prestadas pelos contribuintes. 

Conforme assentado no voto vencedor, o procedimento administrativo somente é legítimo quando as informações ou os documentos apresentados se mostrarem omissos, inconsistentes ou destituídos de credibilidade, cabendo à Administração demonstrar, de forma motivada, que o valor declarado está significativamente dissociado do valor de mercado, sempre com observância do contraditório e da ampla defesa. 

Dessa forma, o julgamento consolidou o entendimento de que as Fazendas estaduais dispõem de competência para instaurar procedimento administrativo de arbitramento da base de cálculo do ITCMD quando o valor informado pelo contribuinte se revelar incompatível com o valor de mercado. Essa faculdade, contudo, não é automática, exigindo a abertura de processo individualizado, no qual a Administração deve demonstrar a inconsistência das informações prestadas, assegurando-se ao contribuinte o exercício do contraditório e da ampla defesa. 

O julgamento do Tema 1.371 revela-se de fundamental relevância para o planejamento sucessório e patrimonial. Com a consolidação do entendimento favorável à tese do Fisco paulista, o cenário passa a exigir maior cautela nas operações de transmissão, tanto de bens imóveis quanto de participações societárias. 

Embora o precedente delimite o arbitramento a hipóteses excepcionais, condicionando-o à instauração de procedimento administrativo individualizado, a decisão amplia o espaço de atuação da Administração Fazendária, o que pode impactar a previsibilidade das operações sucessórias. 

Nesse contexto, ganha especial relevância a adequada comprovação do valor de mercado dos bens transmitidos, bem como a estruturação técnica das declarações, como forma de mitigar riscos e reduzir potenciais questionamentos fiscais. 

A equipe de Direito Tributário do Marins Bertoldi segue acompanhando os impactos da decisão e se coloca à disposição para orientar clientes e parceiros, considerando as especificidades de cada situação concreta. 

Ana Caroline Ferreira

Ana Caroline Ferreira é advogada especialista em direito e processo tributário, com experiência tanto no contencioso tributário, quanto consultivo tributário nacional e internacional de pessoas físicas e jurídicas.   O início...
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