As biografias sempre me pareceram mais interessantes do que livros de ficção. A oportunidade de aprender com a experiência alheia é única e enriquecedora. Um dos aspectos que torna a governança corporativa tão interessante é conhecer como esse tema impactou o trajeto de quem o confrontou. Para o bem e para o mal.
Na gestão das empresas familiares é usual o debate sobre a necessidade de profissionalização do negócio. O termo “profissionalizar” já contém em si próprio uma certa dose de polêmica, pois a princípio todos que exercem alguma atividade remunerada na sociedade podem ser considerados profissionais.
No entanto, o que a história de inúmeras empresas familiares nos revela é que na primeira geração os fundadores concentram em si a gestão de todos os aspectos relevantes da empresa, ainda que isto exija a responsabilidade de cuidar de áreas com as quais os fundadores não possuem familiaridade, tampouco receberam formação acadêmica e/ou profissional sobre elas.
Ao longo do tempo, conforme o negócio cresce, aumenta de forma proporcional a complexidade da sua gestão, salvas raras exceções. É nesse momento que a (in)capacidade dos fundadores em gerir de forma satisfatória diversas áreas da empresa familiar pode ser determinante para a continuidade do negócio, a depender das particularidades de caso.
A exigência por profissionalizar o negócio familiar é interpretada por muitos como a necessidade de trazer profissionais de mercado para ocupar posições estratégicas na empresa. Claro que essa medida pode ser necessária, mas antes é importante que a família entenda com clareza quais são as áreas estratégicas do seu negócio e como está estruturada a gestão destas áreas, para assim poder analisar a quantidade de pessoas que deve ser envolvida na administração das áreas mapeadas (conforme o porte da empresa e sua velocidade de crescimento) e quem são as pessoas na família que possuem as habilidades e competências necessárias para os respectivos cargos.
Um aspecto importante da governança da empresa familiar é justamente fazer periodicamente essa avaliação de competências e recursos humanos. Considerando a complexidade que as conversas sobre esse tema podem ter, assim como os impactos sobre o negócio que as decisões a ele relacionadas podem causar, positiva ou negativamente, é recomendável que a família empresária conte com o apoio de consultores especializados para ajudá-la a conduzir essas questões de forma adequada e compreender quais são de fato as competências que devem ser preenchidas para cada cargo.
A depender do estágio de evolução da empresa familiar, pode haver tempo suficiente para que os membros da família interessados em participar ativamente da gestão do negócio se capacitem para as funções almejadas, tornando desnecessário trazer alguém de fora da família para a gestão da empresa. Em outros casos, não encontrando dentro da família alguém com as competências que o negócio exige, trazer um profissional de mercado pode ser essencial para a continuidade da sociedade.
Em qualquer das hipóteses, é preciso que a família tenha regras claras e objetivas, definidas em acordo de sócios, entre as quais os requisitos que deverão ser atendidos por seus membros que desejarem participar da gestão do negócio. O acordo de sócios traz estabilidade às relações da família empresária ao definir quais são as regras do jogo, preferencialmente por um longo período.
A habilidade da família empresária em conduzir o tema da profissionalização do negócio, capacitando os seus membros e/ou contratando profissionais de mercado, é determinante para a perenidade da empresa familiar. O primordial é que todas as competências chave identificadas como necessárias para a gestão do modelo de negócio específico de cada empresa familiar estejam presentes dentre os colaboradores da empresa, sejam eles membros da família ou não.
Profissionalizar a empresa familiar é, em última instância, municiá-la de pessoas que tenham comprovadamente a capacidade suprir com eficiência todas as exigências que a condução do negócio requer. Não existe uma receita pronta de como fazer isto, mas conhecer os erros e acertos das empresas familiares que já lidaram com esse tema pode ser um benchmarking enriquecedor.