Em janeiro de 2022, foi promulgada a Lei nº 14.302/2022 que prorrogou o Programa de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico da Indústria de Semicondutores (PADIS), a qual possibilitará ao Brasil fomentar a implantação no país de empresas que exerçam as atividades de concepção, desenvolvimento, projeto e fabricação de dispositivos semicondutores e de displays (mostradores de informação).
Essa foi uma vitória do setor, que junto aos parlamentares da Frente Parlamentar para o Desenvolvimento da Indústria Elétrica e Eletrônica, bem como junto ao Ministério da Ciência Tecnologia e Inovação (MTCI), conseguiu, além da prorrogação do programa até 2026, ainda alargar seus benefícios, abarcando insumos utilizados pela indústria, ponto que há muito era alvo de críticas do mercado.
Para rememorar, referido programa prevê a concessão de diversos benefícios fiscais, especialmente no que diz respeito à redução a zero da alíquota de tributos incidentes na importação – (PIS/COFINS; IPI; e II), tornando viável a implementação da indústria nacional especialmente diante da desoneração das máquinas e equipamentos para montagem e fomento fabril, além da redução do custo dos insumos que, em sua grande maioria, são obtidos via importação, benesse trazida pela alteração legislativa promulgada em 2022.
Em 2021, foram importados mais de 80 milhões de módulos e a produção nacional foi de apenas 1 milhão. Com o PADIS, espera-se produzir mais de 5 milhões de módulos no país já neste ano, gerando 2,5 mil empregos diretos, mais de 10 mil empregos indiretos, arrecadação de impostos em torno de R$ 100 milhões nessa cadeia produtiva, segundo dados da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica.
Apesar da ótima notícia, várias empresas vêm enfrentando morosidade do Ministério da Ciência Tecnologia e Inovação no deferimento do denominado “Novo PADIS”, com base nas alterações legislativas trazidas pela Lei nº 14.302/2022 (que alterou a Lei nº 11.484/2007), já que, para além de prorrogar o programa, inseriu como beneficiárias aquelas empresas que realizem investimento em pesquisa, desenvolvimento e inovação, isoladamente ou em conjunto, em relação a: insumos e equipamentos dedicados e destinados à fabricação de componentes ou dispositivos eletrônicos semicondutores.
Em reposta, temos que para concessão do “Novo PADIS” às empresas solicitantes, um “velho problema” se apresenta: em decorrência da mudança trazida pela Lei, que inseriu nova categoria de empresas beneficiárias e inseriu a importação de insumos no rol dos produtos beneficiados, existe a necessidade de atualização das normas infralegais, já que alterações na legislação precisam estar refletidas em Decreto regulamentador (alteração do Decreto nº 10615/2021) e em Portaria (alteração da Portaria ME/MCTI nº 434/2020), principalmente ante a necessidade de atualização da lista de equipamentos e insumos.
Apesar do Ministério já se manifestar sobre a existência de minuta a ser aprovada para ambos veículos normativos (SEI nº 12100.101417/2022-23 e SEI nº 14022.142596/2022-94), até o momento, qualquer solicitação para a concessão do Programa, impinge à empresa solicitante, espera injustificada, já que desde janeiro de 2022, a Lei nº 14.302/2022 vige e prevê benefícios tributários em relação ao quais as empresas já poderiam gozar, desde o desembaraço da mercadoria, quando da transmissão da Declaração de Importação.
Esta demora de seis meses por parte da União, obviamente, vem gerando prejuízos à indústria nacional, que, apesar de ter direito à prorrogação do programa, não consegue o deferimento de sua concessão, por conta de aspecto burocrático ligado à infundada demora na alteração do arcabouço legislativo infralegal, o que na prática, impede o deferimento da solicitação por parte do MCTI e por fim, o aproveitamento da benesse tributária. Em resumo: o PADIS apesar de prorrogado, hoje encontra-se suspenso, em razão de mudança legislativa não realizada no último semestre.
Neste sentido, dois aspectos chamam atenção:
- havendo necessidade de atualização das normas infralegais, no que tange ao adendo relacionado ao alargamento do programa em relação aos insumos importados, seria possível, ao menos, a concessão do “Velho PADIS”, sendo garantido o aproveitamento do programa sem as mudanças legislativas trazidas neste sentido, podendo haver concessão no limite do que era permitido nos anos anteriores, ou seja, para as empresas que realizem investimentos em pesquisa, desenvolvimento e inovação em relação à componentes ou dispositivos eletrônicos semicondutores e mostradores de informação (displays), nos moldes da legislação antiga (Lei nº 11.484/2007 e suas alterações até 2022), sendo suspensa a concessão do programa em relação aos insumos e às empresas que possuem atividades restritas a este nicho, sob a condição de que o gozo dos benefícios do programa, estritamente em relação a estes produtos, apenas se dará após a alteração legislativa. Inclusive porque, a prorrogação do benefício em si, independe de qualquer regulamentação via Decreto ou Portaria, ponto que difere da necessidade de regulamentação da inclusão dos insumos no programa;
- noutra ponta, o MCTI impor à concessão do programa necessidade de alteração legislativa que ele mesmo está em mora para realizar, é na prática suspender os efeitos da Lei, cuja vigência iniciou em janeiro do presente ano, tornando a prorrogação do programa “letra morta”, inclusive para aquela empresas que já faziam jus à concessão do benefício antes de 2022, constrangendo a indústria nacional a diariamente, recolher os tributos quando do desembaraço das mercadorias importadas, mesmo diante do protocolo de concessão, afronta aos princípios da legalidade, moralidade, razoabilidade, entre outros.
Por fim, importante traçamos paralelo com o entendimento que vige quando de outra recorrente demora por parte da União quando da concessão de outro programa de desoneração tributária, o Ex-Tarifário, regime que possibilita redução do imposto de importação incidentes sobre produtos sem produção nacional equivalente.
Verifica-se que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, bem como a própria Procuradoria da Fazenda Nacional, por meio da Nota SEI n.º 28/2019/CRJ/PGACET/PGFN-ME reconhecem que deve ser concedida a benesse de redução do imposto de importação do Ex-Tarifário, com efeitos retroativos. Isto é, apesar de não concedido formalmente o direito ao regime, os benefícios devem atingir as importações efetivadas pela empresa solicitante, após o protocolo do pedido de concessão do benefício, de forma retroativa.
Isso porque, a concessão de tais benefícios possui efeito meramente declaratório, sendo certo que a empresa já preenchia os requisitos legais para a fruição da benesse tributária desde o protocolo dos requerimentos, momento da comprovação constitutiva de seu direito à desoneração tributária, situação idêntica à concessão do PADIS, o que pode levar ao mesmo entendimento por parte do Judiciário.
Portanto, apesar de nova a situação relacionada a demora na concessão do “Novo PADIS”, a injustificada morosidade da União na análise de pleitos de contribuintes que desejam inserção em programas/regimes de desoneração tributária é “velha conhecida” e seja sob qual justificativa se apresente, merece análise criteriosa do Poder Judiciário que deve se manifestar ante aos abusos de direito perpetrados pela União.
O Marins Bertoldi possui equipe especializada no tema e se coloca à disposição para eventuais esclarecimentos.