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Cinco cuidados essenciais na redação de estatutos sociais.

Publicado em: 03 Aug 2009

Antes de expor o que consideramos cuidados básicos na redação de estatutos sociais, lembramos que os estes documentos não são propriamente o ato de constituição das sociedades anônimas (o são a ata da assembleia de constituição ou a escritura pública de constituição), e não apresentam natureza contratual (o que torna distintos dos contratos sociais das sociedades limitadas).

Feitos estes alertas, e por amor à objetividade, vamos aos pontos:

Primeiro: definir clara e cuidadosamente as funções dos diretores. Uma companhia sempre terá mais de um diretor, e é natural que cada qual desempenhe funções específicas. Funções que devem ser claramente distribuídas, para evitar sobreposições ou áreas de incerteza. Em ambos os casos, o resultado evidente é o litígio. Além deste aspecto, deve-se considerar que uma concentração de funções exclusivas do diretor-presidente pode travar os negócios da companhia quando este se encontre, por exemplo, em uma viagem de férias. Imagine-se o caso em que se faz necessária a outorga de uma procuração para a prática de um ato urgente, ou a necessidade de assinatura de atos para instruir propostas em licitações, quando tais documentos somente podem ser firmados por uma só pessoa, que obviamente terá seus períodos fora da cidade ou mesmo do país.

Segundo: constituir conselho de administração de forma útil. Neste órgão (que não é obrigatório para as companhias fechadas sem capital autorizado que são a maioria das sociedades anônimas), um pequeno grupo de acionistas se reúne periodicamente para, principalmente, deliberar sobre a orientação geral dos negócios da companhia. A sua instituição eleva o padrão de governança da sociedade, o que sempre é bem visto pelo mercado. Mas o seu funcionamento demanda custos, que somente serão razoáveis se forem tomados os cuidados para que o seu funcionamento seja eficiente. Criar um conselho de administração simplesmente por criar, ou para servir de esfera de aplausos a todos os atos da diretoria, torna este órgão uma fonte de custos sem razão.

Terceiro: incluir cláusula arbitral em sociedades de médio e grande porte. A arbitragem apresenta uma série de vantagens em relação à alternativa judicial quando se está diante de questões societárias. Além de se contar com a decisão de especialistas na área do litígio, há ganhos decorrentes da maior celeridade do procedimento (a lei prevê a sua conclusão em 6 meses o que nem sempre ocorre) e do absoluto sigilo (o que constitui o maior valor para as companhias, já que a publicidade quanto à existência de um litígio interno pode corroer o valor econômico da sociedade). Mas há uma significativa contrapartida: os custos com a instalação de um procedimento arbitral são muito maiores do que os derivados de uma ação judicial, não só em razão dos honorários dos árbitros e das despesas com a câmara de arbitragem, como também porque são poucos os escritórios de advocacia que têm condições de atuar eficientemente no campo arbitral (e o poder de escassez eleva os preços, como reza a clássica lei da economia).

Assim, deve-se aferir se a sociedade tem uma estrutura econômica que suporte sem dificuldades os custos com os eventuais procedimentos arbitrais, para que sejam evitadas situações em que a parte prejudicada não encontra instrumentos jurídicos para buscar a tutela de seus direitos por não possuir condição econômica para fazer frente ao procedimento arbitral.

Quarto: Não inventar nas regras relativas às assembleias-gerais. A Lei das Sociedades Anônimas tem normas claras e simples a respeito do funcionamento das assembleias-gerais, bem ao contrário do que o Código Civil fez com o procedimento deliberativo das sociedades limitadas. O segredo aqui é não estragar o que funciona bem. É relativamente comum encontrar estatutos que criam quóruns deliberativos especiais, formas peculiares de convocação e regras de procedimento que não trazem nada de útil. E, o que é pior: ao se redigir artigos estatutários que excepcional o regime legal (e que muitas vezes fogem ao bom senso), cria-se a possibilidade de propositura de ações de anulação de deliberações sociais por ofensa a tais regras (que nem sempre acabam por ser efetivamente assimiladas pelos acionistas ou administradores). Sempre que possível, deve-se evitar a inclusão, nos estatutos e em outros documentos societários, de munição para brigas entre sócios e administradores. Brigas que sempre trazem prejuízos aos negócios sociais.

Quinto: Não incluir matérias típicas de um acordo de acionistas. Definições quanto a votações futuras, quanto a ingresso de familiares na administração da sociedade, quanto a critérios pessoais de escolhas de diretores, quanto à política de investimentos futuros e outras relativas ao relacionamento entre os acionistas devem constar de acordos de acionistas. A contrário senso, não se deve incluir em acordos de acionistas matérias típicas de estatutos. Cada documento tem funções e estrutura próprias, a começar pelo fato de o acordo apresentar natureza contratual, diferentemente dos estatutos. Na prática, é comum a confusão: acordos com conteúdo de estatuto e, o que é ainda pior, acordos e estatutos tratando das mesmas matérias de forma distinta.

Além destes cinco aspectos, há uma observação final que nós, advogados, costumamos ignorar: o mais importante é o negócio, e não os documentos que o cercam. Antes de redigi-los, devemos conhecer bem a forma de atuação de cada empresa, para evitar a prejudicial pretensão de impor conceitos jurídicos sobre uma realidade empresarial eficiente. A prática mostra que nenhum negócio é igual a outro, fazendo com que cada estatuto tenha cores próprias, e com isso afastando a possibilidade de simples utilização dos famigerados modelos de atos societários.

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