A “MP do Agronegócio” atualiza regras e amplia os mecanismos disponíveis ao fomento do Agronegócio, visando impactar diretamente o crédito rural.
No dia 1º de outubro de 2019, o Governo Federal editou a Medida Provisória nº 897/2019, normatizando as medidas de atualização do sistema de financiamento do Agronegócio anunciadas no Plano Safra 19/20.
Conforme anunciado no Plano Safra, a chamada MP do Agronegócio atualizou, criou e flexibilizou regras aplicáveis aos instrumentos de fomento do Agronegócio, com destaque para a criação do Fundo de Aval Fraterno, a instituição do Regime de Afetação do Imóvel Rural e da Cédula Imobiliária Rural, a equalização das taxas de juros para instituições financeiras privadas, a possibilidade de previsão de correção cambial à CPR, dentre outras medidas analisadas a seguir:
FUNDO DE AVAL FRATERNO (“FAF”)
Fica instituída a possibilidade de que até 10 devedores (produtores rurais) formem um FAF, objetivando consolidar recursos para serem oferecidos como garantia em operações de crédito rural perante instituições financeiras.
O FAF será formado pelos devedores e a instituição financeira credora ou os credores originais, no caso de consolidação de dívidas, e a instituição garantidora, se houver.
Os recursos consolidados pelo FAF serão acessados subsidiariamente, apenas no caso de esgotamento das garantias reais ou pessoais prestadas pelo devedor da operação de crédito.
Este acesso ocorrerá de acordo com os níveis de cotas instituídos pela MP. Primeiramente acessa-se os recursos referentes às cotas primárias, de responsabilidade dos devedores, e sucessivamente as cotas secundárias, de responsabilidade dos credores (instituição financeira ou credores originais, no caso de consolidação de dívidas) e por último as cotas terciárias, de responsabilidade da instituição garantidora.
PATRIMÔNIO DE AFETAÇÃO DO IMÓVEL RURAL E A CÉDULA IMOBILIÁRIA RURAL
A MP do Agronegócio cria ainda a possibilidade de o proprietário de imóvel rural estabelecer regime de afetação sobre o imóvel, seja de forma integral ou em fração determinada. Até então não existia a possibilidade de fracionamento do imóvel para oferecimento de garantias. A ferramenta poderá ser utilizada como garantia em operações de crédito contratadas junto a instituições financeiras.
Via de regra, o patrimônio colocado em regime de afetação não se comunica com os demais bens, direitos e obrigações do patrimônio geral do proprietário ou de outros patrimônios de afetação por ele constituídos, desde que o patrimônio afetado esteja vinculado a uma ou mais Cédulas Imobiliárias Rurais (“CIR”) e que o imóvel não esteja gravado por hipoteca, alienação fiduciária ou outra espécie de ônus real.
No entanto, a incomunicabilidade do patrimônio afetado não se aplica às dívidas de natureza trabalhista, previdenciária ou fiscal.
Pequenas propriedades rurais, áreas inferiores ao módulo rural e os bens de família não podem se sujeitar ao regime de afetação.
A CIR tem as seguintes características:
- Constitui título de crédito nominativo, transferível e de livre negociação;
- A cédula é representativa da promessa do pagamento em dinheiro, bem como da promessa de entregar o patrimônio afetado ao credor, nas hipóteses em que não houver o pagamento da dívida;
- O patrimônio de afetação pode ser utilizado integralmente ou parcialmente para garantia de uma CIR;
- A cédula poderá ser garantida por terceiros, inclusive por instituição financeira ou seguradora.
O registro ou depósito da CIR em entidade autorizada pelo Banco Central ou pela
Comissão de Valores Mobiliários é requisito para a vinculação do patrimônio de
afetação.
EQUALIZAÇÃO DAS TAXAS DE JUROS PARA INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS PRIVADAS
A MP altera a Lei nº 8.427/92, possibilitando a concessão de subsídio econômico, através da equalização de taxas de juros, para instituições financeiras privadas que operem o crédito rural.
Antes apenas os bancos públicos, cooperativas de crédito e confederações de cooperativas de crédito recebiam subvenção. Com a medida, espera-se o aumento da competitividade entre os agentes financeiros na oferta do crédito rural.
CÉDULA DE PRODUTO RURAL (“CPR”)
Já no âmbito da Cédula de Produto Rural (“CPR”), a MP alterou a Lei nº 8.929/94, criando a CPR escritural e possibilitando a previsão de correção pela variação cambial.
A partir de julho de 2020, o registro ou depósito da CPR em entidade autorizada pelo Banco Central ou pela Comissão de Valores Mobiliários a exercer a atividade de registro ou de depósito centralizado de ativos financeiros e de valores mobiliários será requisito para a CPR possuir eficácia. Fica dispensado assim o registro do título em cartório, com exceção dos casos em que houver hipoteca, penhor rural ou alienação fiduciária sobre o bem dado em garantia.
Quanto à CPR com previsão de correção pela variação cambial, deverão ser observados os seguintes requisitos:
- Emissão na modalidade de liquidação financeira;
- Os produtos rurais objeto do título serem referenciados ou negociados em bolsas de mercadorias e futuros, nacionais ou internacionais;
- Ser emitida em favor de: (i) investidor não residente; ou (ii) companhia securitizadora, para lastro de operação vinculada a Certificado de Recebíveis do Agronegócio (“CRA”); ou (iii) pessoa jurídica apta à emitir Certificado de Direitos Creditórios do Agronegócio (“CDCA”), com o fim exclusivo de ser vinculada ao CDCA.
SUBVENÇÃO ECONÔMICA PARA EMPRESAS CEREALISTAS
A MP 897/19 trouxe medidas para fomentar a ampliação da capacidade de armazenagem de grãos, visando reduzir o déficit existente no Brasil se comparado com os principais players mundiais do setor do agro.
Com a criação do Programa para Construção e Ampliação de Armazéns (“PCA”), as empresas cerealistas poderão pleitear financiamento para a realização de obras, aquisição de máquinas e equipamentos para a construção de armazéns. As operações serão realizadas pelo Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) até 30 de junho de 2020, com taxas de juros subvencionadas pelo Tesouro Nacional. Serão disponibilizados R$ 200 milhões para o programa. No entanto, a subvenção fica limitada a R$ 20 milhões por ano, valor inexpressivo para atender a demanda atual.
Ressalta-se que, embora a Medida Provisória 897/19 esteja em vigor, a normativa aguarda apreciação do Congresso Nacional, em até 120 dias contados de sua publicação, para sua conversão em lei; portanto, o texto proposto está sujeito a alterações ou até mesmo a perda de eficácia, caso a conversão em lei não ocorra no prazo em questão.
MARINS BERTOLDI ADVOGADOS
Área de Direito do Agronegócio
(O presente material tem caráter meramente informativo, não devendo ser interpretado para qualquer finalidade como aconselhamento legal. A equipe do Marins Bertoldi Advogados permanece à disposição de seus clientes para qualquer esclarecimento necessário sobre os temas abordados acima.)