Na última quarta-feira (04/10/23), a Câmara dos Deputados decidiu por adiar a votação do Projeto de Lei (“PL”) nº 4173/2023 que trata da tributação da renda auferida por pessoas físicas residentes no País em aplicações financeiras, entidades controladas (“offshores”) e trusts no exterior. Tal decisão decorre da cobrança por alterações no texto encaminhado pelo governo em agosto de 2023 – mês de encerramento da Medida Provisória nº 1171/2023, que tratava do mesmo tema.
Sem data definida para a votação, o tema é uma das prioridades do Governo para 2024 e tramita em regime de urgência na Câmara dos Deputados. Por esta razão, passamos a analisar os principais pontos de atenção do texto original do PL.
Projeto de Lei (PL) nº 4173/23
Com o intuito de estabelecer um regime tributário uniforme e progressivo, o PL propõe alterações na atual sistemática de tributação sobre a renda auferida no exterior por brasileiros, tanto de forma direta, quanto por meio de estruturas societárias, conhecidas como “Private Investment Companies” – PIC (offshores), bem como trusts.
Segundo o texto do PL, a pessoa física residente no País computará na Declaração de Ajuste Anual (“DAA”), de forma separada, os rendimentos do capital aplicado no exterior, nas modalidades de: (i) aplicações financeiras, (ii) lucros e dividendos de entidades controladas e (iii) bens e direitos objeto de Trust. Tais rendimentos ficarão sujeitos a incidência do IRPF pelas alíquotas progressivas que variam de 0% a 22,5%, aplicando-se a alíquota majorada sobre a parcela anual dos rendimentos que ultrapassar R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais).
Modalidades de investimentos no exterior
Em relação a primeira modalidade de investimento, o PL dispõe que os rendimentos das aplicações financeiras deverão ser tributados quando forem auferidos (efetivamente percebidos) pela pessoa física, pelo regime de caixa.
No que se refere a segunda modalidade de investimento, os rendimentos gerados por meio de controladas no exterior (offshore), passam a ser tributados anualmente pelo regime de competência – independentemente da distribuição efetiva dos lucros. Tal sistemática altera significativamente a regra de tributação até então vigente, cuja incidência ocorre somente na efetiva transferência de recursos pela entidade para o sócio pessoa física residente no Brasil (ou seja, prevê o diferimento da tributação).
Contudo, importante esclarecer que não será todo rendimento gerado por controlada no exterior que estará sujeito à tributação automática dos lucros (regime de competência), para tanto, a sociedade offshore deve atender a dois critérios alternativos: (i) estar localizada em um país com tributação favorecida ou beneficiária de um regime fiscal privilegiado (paraíso fiscal) e/ou (ii) ter renda passiva predominante (superior a 40% da renda total).
Alternativamente, o PL prevê a opção da “transparência da personalidade jurídica” da offshore, em outras palavras, possibilita que as pessoas físicas que possuam investimentos por meio de offshores optem por declarar os ativos e direitos mantidos pela entidade como se fossem de sua propriedade direta, ou seja, os rendimentos recebidos pela offshore podem ser tributados de acordo com as regras de investimento direto (regime de caixa). Essa opção é irrevogável e permanente enquanto a pessoa física for a detentora da entidade controlada no exterior.
No que diz respeito à terceira modalidade, que corresponde ao instituto jurídico do Trust, que até então não possui previsão expressa no nosso ordenamento jurídico, o PL visa apresentar novas diretrizes e conceitos para a tributação da renda, afastando a sujeição tributária da sistemática do recolhimento mensal (carnê-leão) do IRPF.
Por fim, com objetivo de antecipar a tributação do ganho de capital de bens e direitos mantidos no exterior, o PL oferece a opção de os contribuintes atualizarem o valor de tais ativos para o valor de mercado em 31 de dezembro de 2023, tributando a diferença em relação ao custo de aquisição com uma alíquota reduzida, desde que o imposto seja pago até 31 de maio de 2024. O texto original trouxe a alíquota de 10%, contudo o relator do PL propôs a redução para 6%. Lembrando que pela regra geral, a tributação sobre o ganho de capital auferido do exterior é de 15%.
Demais disposições
O Projeto de Lei está inserido entre as várias propostas da reforma tributária e, se aprovado ainda este ano, produzirá efeitos a partir de 1º de janeiro de 2024. No entanto, é possível que ocorram algumas alterações em seu conteúdo.
Investidores brasileiros que tenham capital investido no exterior deverão ficar atentos a tais alterações legislativas e, a depender de seus interesses, poderão se beneficiar de alguns planejamentos tributários trazidos pelo PL, dentre outros que visem mitigar os impactos da alteração tributária.
Por Ana Caroline Ferreira e Mariana de Meira Todeschini