Por Ana Cláudia Lechakoski e Victória Nichele
No planejamento patrimonial e sucessório, especialmente em famílias empresárias, é comum que pais avaliem a possibilidade de transferir bens ou participações societárias aos filhos menores de idade. Essa iniciativa traduz uma preocupação legítima em estruturar a sucessão com antecedência, preservar o patrimônio construído e assegurar a continuidade da governança familiar, com base em regras claras e alinhadas aos valores que norteiam a própria organização do núcleo familiar.
Geralmente, os pais doam bens aos filhos com reserva de usufruto. A preocupação surge na hipótese de falecimento do doador e extinção desse usufruto. Ex.: a mãe doa quotas de uma sociedade ao filho menor e tem receio de que, quando falecer, o pai dele, com quem não tem uma boa relação, passe a administrar o patrimônio do filho. Assim, quando os pais são divorciados ou há conflito entre eles, surgem os dilemas: até que ponto os pais podem administrar ou usufruir dos bens destinados aos filhos? É possível estabelecer limites seguros para garantir que esse patrimônio seja destinado ao que se pretende? Como equilibrar a organização jurídica com a dinâmica familiar?
Compreender como funciona o usufruto parental e a administração legal dos bens de filhos menores é essencial para que o planejamento patrimonial atinja seu objetivo: transmitir, organizar e proteger — sem gerar conflitos, exposições desnecessárias ou incertezas sobre o futuro da estrutura familiar.
A boa notícia é que o ordenamento jurídico brasileiro oferece instrumentos claros para lidar com essas questões. Com as decisões certas, é possível estruturar um planejamento juridicamente sólido, com previsibilidade e alinhamento aos objetivos da família.
O que é o usufruto legal dos pais?
Enquanto estiverem no exercício do poder familiar e não houver um usufruto contratual estabelecido, pai e mãe têm direito ao usufruto legal sobre os bens pertencentes aos filhos menores (art. 1.689 do Código Civil). Esse usufruto permite que eles percebam os frutos civis dos bens — como rendimentos de aluguéis, dividendos ou aplicações financeiras — até que o filho atinja a maioridade ou seja emancipado.
Mas existem exceções. O artigo 1.693 exclui do usufruto:
• Bens adquiridos pelo filho com o próprio trabalho;
• Bens recebidos com cláusula de exclusão do usufruto parental, como frequentemente ocorre em doações e testamentos.
Essas exceções podem e devem ser consideradas em planejamentos que envolvem filhos menores, quando o objetivo é garantir maior controle sobre a destinação e o uso dos bens.
E quem administra os bens?
A administração também é, por regra, dos pais. No entanto, certos atos dependem de autorização judicial (art. 1.691):
• Venda ou oneração de bens imóveis;
• Renúncia de direitos patrimoniais;
• Realização de doações;
• Contratação de empréstimos em nome do menor.
Se houver conflito de interesses entre os pais e o filho menor, o juiz pode nomear um curador especial (art. 1.692 do Código Civil).
Como estruturar o planejamento patrimonial envolvendo filhos menores?
Na transmissão de bens aos filhos menores, é possível estabelecer a condição de não serem usufruídos ou administrados pelo(s) pai(s) (art. 1.693, III do Código Civil). Isso impede que os pais usufruam dos frutos gerados pelos bens, garantindo que esses valores permaneçam vinculados ao interesse direto do filho.
Nesse caso, é possível nomear de antemão uma ou mais pessoas que ficarão encarregadas da gestão do patrimônio do filho até que ele complete a maioridade.
Essa condição não elimina as demais responsabilidades legais dos pais, confere maior previsibilidade à gestão do patrimônio e permite que a vontade de quem transmite os bens seja respeitada.
Conclusão
Planejamentos patrimoniais que envolvem filhos menores exigem conhecimento técnico, sensibilidade e alinhamento com a realidade familiar. A área de Governança e Planejamento Sucessório do Marins Bertoldi Advogados é responsável por tratar dessas questões com o cuidado que exigem, estruturando soluções jurídicas que conferem segurança e coerência à sucessão. Quando bem conduzidas, essas decisões antecipam soluções, evitam conflitos e asseguram a continuidade do projeto familiar com estabilidade e respaldo legal.