Foi publicada na madrugada desta quarta-feira (02/04/2020) a Medida Provisória nº 936/2020, que já vinha sendo anunciada há dias pelo Presidente Jair Messias Bolsonaro e pelo Ministro Paulo Guedes, que prevê, basicamente, novas regras para redução de salário em percentuais maiores, inclusive, do que aqueles estabelecidos na CLT, bem como para suspensão do contrato de trabalho.
Como forma de compensação, os empregados atingidos por medidas destas natureza receberão o Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda, cujas condições e parâmetros também foram estabelecidos na MP, que terá por base o valor do seguro-desemprego ao qual o empregado teria direito e será proporcional à redução praticada no emprego.
Evidente que os contornos destas medidas, assim como a constitucionalidade de diversos dispositivos, ainda serão objeto de muita discussão por parte do Judiciário. Todavia, fato é que estas novas medidas já estão em pleno vigor e podem representar alternativas relevantes para que as empresas enfrentem este período de crise sem precedentes.
Objetivos
O objetivo principal da Medida Provisória nº 936/20, na linha do que já dizia sua ‘irmã mais velha’ (MP nº 927/2020), é, sem dúvidas, a preservação de empregos e de renda mínima aos empregados. Deste modo, é este o raciocínio que deverá nortear qualquer medida tomada pelo empregador e cuja comprovação será essencial, no futuro, para que consigamos defender a validade de qualquer que seja a postura adotada neste momento de pandemia.
Todavia, esta MP traz também um outro objetivo, explícito no art. 1º, que é o da garantia da continuidade das atividades laborais da empresa. Isto reforça a ideia de que as medidas não devem ser adotadas como mera forma de economia, mas apenas nos casos em que isto for realmente necessário para que a empresa não “feche as portas” neste momento.
A nova legislação também tentou ‘remendar’ o texto da MP 927/2020, que prevê a suspensão de determinadas exigências de saúde e segurança no trabalho durante o período de calamidade pública, já que esta suspensão havia sido interpretada por muitos como uma ‘carta branca’ para que as empresas não observassem os regramentos necessários com relação à matéria.
Para isso, a MP 936 esclareceu, em seu artigo 19, que eventuais exceções estabelecidas nos regramentos de emergência não autorizam o descumprimento das normas regulamentadoras editadas em matéria trabalhista, o que também é indício de que a intenção das medidas que vem sendo estabelecidas para enfrentamento da pandemia do COVID-19 devem sempre ter por objetivo a preservação de empregados e da própria empresa e não devem ser utilizadas para fins meramente lucrativos.
Redução salarial
Segundo o texto da nova MP, os salários poderão ser reduzidos em 25%, 50% ou 70%, preservando-se sempre o valor do salário hora do empregado, pelo período de até 90 dias. O Ministério da Economia deve, obrigatoriamente, ser informado pela empresa sobre este procedimento no prazo de 10 dias, contados da celebração do acordo com o colaborador. A forma de comunicação ainda será definida por Ato do Ministério da Economia.
Para empregados com salário igual ou inferior a R$ 3.135,00 e para os hipersuficientes (portadores de diploma superior e que recebam salário igual ou superior a 2x o limite máximo dos benefícios da previdência – atualmente R$ 12.202,12), o acordo pode ser individual. Já com relação aos que não se enquadram nestes critérios, apenas a redução em 25% poderá ser feita diretamente com o empregado, sendo necessário acordo ou convenção coletiva de trabalho para redução em outros patamares.
Suspensão do contrato de emprego
A MP também prevê a possibilidade de suspensão do contrato de trabalho pelo período máximo de sessenta dias, que pode ser fracionado em dois períodos de trinta dias.
Este procedimento depende de acordo individual, documento este que deve ser encaminhado ao empregado com, no mínimo, 2 dias de antecedência. Também é importante pontuar que os benefícios concedidos por parte dos empregados não podem ser cortados e que, durante a suspensão, fica vedado o desenvolvimento de quaisquer atividades relacionadas ao trabalho, inclusive por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou à distância, sob pena de descaracterização da suspensão e obrigatoriedade de pagamento imediato da remuneração referente a todo o período, bem como da incidência das penas previstas em lei e em norma coletiva.
Ao longo deste período, o pagamento de salários fica igualmente suspenso, salvo no caso de empresas que tenham auferido receita bruta superior a R$ 4.800.000,00 no ano de 2019, que deverão manter o pagamento de 30% do salário dos empregados mesmo na hipótese de suspensão.
Outros pontos importantes
Mesmo nas hipóteses de redução salarial ou suspensão, o empregador pode acordar com seus empregados o pagamento de ajuda compensatória, que terá natureza indenizatória, gozará de uma série de outras vantagens tributárias e não impedirá o recebimento do Benefício Emergencial de Preservação do Emprego estabelecido pela MP 936.
Além disso, um dos pontos principais da medida é a garantia provisória no emprego aos empregados que sofrerem redução salarial ou suspensão dos contratos, que irá perdurar não apenas durante o período de redução ou suspensão, mas também por igual período após o encerramento destas medidas. A dispensa sem justa causa aplicada neste interregno de tempo sujeitará o empregador a indenizações previstas no art. 10º, I, II e III, todos da MP, sem prejuízo de condenações à reintegração e ao pagamento de outras verbas em ação trabalhista futura.
Ainda, foi estabelecida a possibilidade de redução salarial em percentuais diferentes daqueles mencionados no texto da medida, com indicação acerca do valor dos benefícios compensatórios a serem recebidos pelos empregados de acordo com cada nível de redução acordado.
Uma ferramenta importante trazida pela nova legislação foi a possibilidade de utilização de meios eletrônicos para realização dos procedimentos necessários para viabilizar a realização de acordos coletivos de trabalho de forma mais ágil e menos burocrática, o que pode ser entendido como forma de estímulo para a negociação coletiva neste momento.
É interessante pontuar que eventual suspensão dos contratos ou redução salarial não deverá prejudica o exercício e funcionamento de serviços públicos e atividades essenciais estabelecidas pelas Leis nº 7.783/1989 e 13.979/2020, como é caso, por exemplo, de tratamento e abastecimento de água, produção e distribuição de energia elétrica, gás e combustível, assistência médica e hospitalar, telecomunicações e distribuição e comercialização de medicamentos e alimentos.
Por fim, muito importante ressaltar que qualquer medida tomada com base na MP nº 936/20 deverá ser comunicada ao Sindicato profissional no prazo de 10 dias corridos, contados da celebração do acordo com os colaboradores e estará sujeita a fiscalizações por parte das autoridades competentes.
Danielle Blanchet | Advogada Trabalhista do Marins Bertoldi Advogados