O Programa de Regularização Tributária e Cambial (RERCT), ou programa de repatriação, foi encerrado há algumas semanas. Uma nova etapa se inicia, voltada agora para a análise do correto tratamento tributário em relação aos rendimentos produzidos pelos ativos mantidos no exterior e que agora estão devidamente regularizados.
Há o equivocado entendimento, por parte de alguns contribuintes, de que a entrega da Declaração de Regularização Cambial e Tributária (DERCAT) e o pagamento do imposto de renda e da multa solucionaram de forma definitiva os problemas fiscais que essas operações poderiam apresentar.
De fato, a adesão ao RERCT, desde que realizada corretamente, resolveu a questão mais sensível: a criminal. Entretanto, esse é somente o início de um longo caminho a ser percorrido pelos contribuintes para evitar problemas futuros com o Fisco.
Os contribuintes serão obrigados a analisar detalhadamente todos os efeitos dessa adesão e o melhor formato para a manutenção desses investimentos no exterior, tanto do ponto de vista do melhor retorno financeiro, como também dos efeitos tributários inerentes ao modelo escolhido.
O que se pôde perceber ao longo do processo de regularização é uma peculiar característica desses contribuintes, em geral pessoas físicas que, ao longo das décadas de 80 e 90, com receio de um sistema financeiro frágil e uma economia não confiável, optaram por manter recursos no exterior como medida de proteção No que tange ao passado, os aspectos tributários e, principalmente, criminais foram solucionados com a entrega da DERCAT, da CBE (Capitais Brasileiros no Exterior) e as retificações necessárias na Declaração do Imposto de Renda para Pessoa Física (DIRPF). Na mesma linha, ficou resguardado, obviamente, o direito do Fisco verificar a veracidade das informações declaradas.
O alerta é que o maior trabalho ainda está por vir, haja vista que os investimentos no exterior mantidos por pessoa física são resguardados por um complexo sistema de tributação, que poucos têm a capacidade de compreender.
Será preciso dedicar um bom tempo na análise, não só do melhor retorno financeiro, mas também nas dificuldades de controle e cumprimento de diversas obrigações tributárias, que decorrerão dos ganhos financeiros auferidos. Aqueles que possuem investimentos financeiros no Brasil, principalmente decorrentes de renda variável têm uma ideia da dificuldade referente ao controle da tributação desses recursos. Quando os investimentos são no exterior, essa dificuldade aumenta de forma significativa. São diversas as variáveis que devem ser observadas no momento de verificar o montante do Imposto de Renda a ser recolhido no final de cada mês.
O primeiro grande cuidado a ser tomado é observar qual a origem dos valores aplicados e em qual moeda. A origem dos recursos determina a forma de tributação dos investimentos. Caso o contribuinte possua recursos cuja origem seja exclusivamente em moeda estrangeira, poderá deixar de pagar um eventual ganho de capital sobre a variação cambial ocorrida no período.
Outra dificuldade está em definir o que é rendimento (juros e dividendos, por exemplo) sujeito a tabela progressiva do Imposto de Renda e a apuração e recolhimentos mensais (carnê-leão) em contrapartida da apuração de eventual ganho de capital, que possui alíquota específica (15% a 22,5%) e é sujeito a tributação definitiva.
Esse acompanhamento deve ser feito mensalmente e o período de entrega da Declaração de Imposto de Renda deve ser utilizado apenas para a consolidação e registro das informações sobre esses ativos e seus rendimentos. Não agindo dessa forma, o contribuinte poderá ser surpreendido de forma negativa com valores significativos de multas e juros além do próprio tributo que deverá ser recolhido de uma só vez.
Hugo José Sellmer, advogado especialista em Direito Tributário do escritório Marins Bertoldi Sociedade de Advogados